desdobramento

Clínica psiquiátrica irregular é alvo de queixa de vizinhos no centro de Santa Maria

Marcelo Martins

Foto: Pedro Piegas (Diário)
Local fica na Avenida Dores, no centro da cidade, e atende 10 pacientes com transtornos mentais

A Comissão de Políticas Públicas da Câmara de Vereadores de Santa Maria quer entender o funcionamento de um centro para atendimento de pessoas com transtornos mentais, que fica na região central da cidade. Desde fevereiro, o imóvel, localizado na Avenida Nossa Senhora das Dores, recebe pacientes encaminhados pelo Judiciário ou pelo Ministério Público (MP) e que estejam, entre outros, "interditados" a pedido de familiares. 

Ainda na semana passada, os parlamentares da Casa ouviram a dona do Centro Terapêutico Santa Maria, como é chamado o local, e também moradores do entorno que se mostram preocupados com o funcionamento da unidade perto de uma área residencial.

À frente do centro Terapêutico, a empresária Clevy de Oliveira Ramos assevera que a clínica está sendo vítima do preconceito das pessoas que não entendem o que é a proposta do serviço prestado e, também, da inoperância da prefeitura. Segundo ela, a administração municipal tem "engessado" o funcionamento do espaço, que abriga 10 pacientes.  

- Tudo tem sido difícil dentro da prefeitura, nada acontece. Veja que estamos atendendo pacientes, que são encaminhados pelo poder público, e estamos operando sem os alvarás. É algo que não dá para compreender. Tudo é difícil e as coisas andam a passos lentos. E sobre os pacientes, é preciso dizer que eles têm transtornos mentais graves e não são dependentes químicos, como é dito - afirma Clevy.

A advogada Noemi Santos, que acompanha o caso pelo lado da clínica, afirma que a questão já foi judicializada na tentativa de dar celeridade à liberação da documentação necessária para que o local funcione dentro do regramento previsto: 

- Ingressei com uma ação para que o Judiciário desse o alvará de funcionamento. Até porque (a prefeitura) indeferiu o (alvará) sanitário e, por tabela, inviabilizou os (alvarás) de localização e de funcionamento. O saldo disso tudo, entre essas idas e vindas, é que estamos sem o alvará para funcionar regularmente.  

Conforme Clevy, cada paciente tem um custo estimado de R$ 2,3 mil, valor que é dividido entre Estado e município (o que é confirmado pela prefeitura). Ela garante que, no local, trabalham enfermeiros, terapeuta ocupacional, psicólogo e nutricionista que garantem atendimento nos três turnos e são custeados pela própria clínica. 

RECLAMAÇÕES

Moradores do entorno do local já realizaram um abaixo-assinado para a saída do centro do imóvel e se mostram receosos quanto ao risco da atividade, como exemplifica um vizinho da casa que pediu para ter o nome preservado:

- A gente não é contra o funcionamento da clínica, não se trata disso. Mas somos, sim, contrários à forma de funcionamento, sem os alvarás necessários, e, principalmente, como a prefeitura tem permitido isso. E temos imagens e vídeos que mostram situações que nos preocupam. Já vimos, por exemplo, homens urinando e fumando no pátio.

O vereador Admar Pozzobom (PSDB), que preside a Comissão de Políticas Públicas da Casa, afirma ser prematuro dar uma avaliação "mais precisa sobre o tema". Mas, para ele, a prefeitura deve "explicações condizentes e satisfatórias" acerca do assunto.

Prefeitura já notificou a clínica por funcionar sem alvará 
O chefe da Casa Civil, Guilherme Cortez, explica que a prefeitura tem conhecimento da situação e que trata o tema junto com outras secretarias, como as de Saúde e Desenvolvimento Social, e também com a Procuradoria Jurídica. Cortez reconhece que o Centro Terapêutico Santa Maria funciona sem alvará e, inclusive, já foi emitida em março, uma notificação para que o estabelecimento se regularize o quanto antes.

Cortez avalia, contudo, que a questão não pode ser meramente olhada pelo prisma da falta dos alvarás. Segundo ele, a clínica terá de se regularizar sob pena de fechamento. Ainda assim, ele questiona as consequências disso para as pessoas que estão lá internadas: 

- O município e a sociedade não podem fechar os olhos para essas pessoas que, muitas vezes, infelizmente, nem as famílias querem. Agora, somos legalistas, e não podemos compactuar com a falta de observância da lei. Eles terão de se regularizar.

O secretário de Saúde, Francisco Harrisson, faz um mea culpa e avalia que o poder público, ao longo dos anos, falhou no atendimento a essas pessoas. Segundo ele, ainda neste semestre, a prefeitura viabilizará a criação do primeiro residencial terapêutico (leia mais abaixo), que é desdobramento de uma ação civil pública movida em 2015 pelo Ministério Público (MP), para a implementação desse tipo de serviço.

- Santa Maria terá o primeiro espaço e, inclusive, estamos em busca de um imóvel que vamos alugar para viabilizar o serviço desse residencial terapêutico. Estamos trabalhando para abri-lo já neste semestre - diz.

À prefeitura, a direção da clínica garante que a situação do imóvel na Avenida Dores é temporária, pois aguardada a conclusão das reformas de um imóvel em Itaara, onde o serviço será prestado de forma definitiva.  

Ação movida pelo MP previa 14 residenciais terapêuticos
Ainda em 2015, o promotor de Justiça Fernando Chequim Barros deu início a um amplo mapeamento da necessidade de Santa Maria ofertar os chamados residenciais terapêuticos (RTs). Do trabalho dele, naquele mesmo ano, houve a instauração de um inquérito para apurar a inexistência desse tipo de serviço e como o município agia para atender a esses pacientes que, na maioria, eram encaminhados para outras cidades.  

Desde o início das investigações, o promotor diz que foram feitas várias diligências que apontaram que, em Santa Maria mesmo, havia pessoas com problemas mentais e que estavam sendo abrigadas indevidamente em casas geriátricas. Conforme a legislação, quem sofre de transtorno psíquico deve ficar em residenciais terapêuticos, que são limitados, por lei, a receber, no máximo, 10 moradores.

Após a instauração do inquérito, o MP constatou a necessidade de o Executivo municipal implementar esse serviço. Em outubro de 2015, Barros ingressou com uma ação civil pública contra o município. Nela, o MP apontava a necessidade da criação de 14 residenciais terapêuticos em até 18 meses. Também foi requerido que a prefeitura passasse a prever orçamento para essa demanda.

PARECER DO STJ
Em outubro de 2016, a juíza Eloisa Helena Hernandez de Hernandez julgou parcialmente procedente a ação do MP e determinou que o município apresentasse, em até 90 dias, um projeto para viabilizar o atendimento a essas pessoas por meio dos residenciais. A sentença da juíza foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJ-RS). Mas a prefeitura ingressou com recurso especial que, no momento, aguarda por análise do Superior Tribunal de Justiça (STJ).    

O promotor explica com um exemplo a complexidade e a gravidade que o tema envolve:

- Esses residenciais são para abrigar pessoas com transtornos mentais e que estejam em vulnerabilidade social. Há legislação que dá esse resguardo, mas que, infelizmente, é descumprida. Santa Maria não tem e segue, até hoje, sem ter um residencial terapêutico - afirma Barros.

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